Num dia desses, numa atitude apressada de mulher que deixa tudo pra hora final, fui a um salão de beleza solicitar uma urgente resolução para as minhas unhas. Chegando lá, sem nunca ter visto a manicure, comuniquei minha necessidade e perguntei se por acaso ele teria aquela nova coleção de vermelhos da Risque. A resposta dela me surpreendeu. Foi assim: “Eu não, moça! Aquilo é coisa de Pomba Gira! Meu Pastor falou que o que eu num quero pra mim eu não posso oferecer pras minha criente. Ele disse que aquilo é do capeta…”.
Chocada com a ignorância deste ser, abalada com a falta de capacidade mental dessa pessoa de raciocinar ou de pelo menos me esconder o real motivo de não ter adquirido os esmaltes, quis cancelar o pedido. Definitivamente não queria que tal espécie humana fizesse minhas unhas, mas como essas já estavam mergulhadas em seu pote, deixei passar, desistindo ao menos de fazer as mãos.
Para não discutir com ela, depois de um comentário leve sobre os outros tons de vermelho que ela tinha e que não classificava como sendo “da pomba gira”, me calei. Entendendo minha atitude ela ligou o DVD da Comunidade Internacional da Zona Sul tentando me ‘reevangelizar’ (não sei como ficou isso com a nova reforma ortográfica) – Devo aqui comentar que este grupo parece não ter lido o versículo da Bíblia “Não useis de vãs repetições”, porque suas músicas são só isso… Um blá blá blá de “Jesus é isso, Jesus é aquilo” sem nenhuma profundidade, sem razão de ser, sem nenhuma inspiração plausível. Nada de novo. Aquele mesmo modismo das palavras de um vocabulário curto neopentecostal… E viva o João Alexandre, o Sérgio Lopes, o Hudson, o Amós, o Renan rs… -
Mas voltando ao salão: Numa outra atitude ainda um pouco rebelde, liguei meu mp3 pra não ouvir aquela baboseira. Daí, minha manicure começou a falar pra cabeleireira que tinha sonhado comigo na noite anterior. Ela falou o seguinte: “Ô, fulana, lembra que eu te contei que sonhei que brigava com uma moça essa noite?” “Sim”, “Então, eu te disse que era Ciclana, mas esqueci de te contar que o rosto dela se transformava de vez em quando e virava bem essa moça aqui… Foi de Deus, viu?! Nem conhecia ela e sonhei que a gente brigava feio… Hummm, Senhor, nem vou contar o sonho todo porque o Senhor ta me mandando ficar calada” Nessa hora eu ri. Ela teve coragem de me provocar com uma ‘profetada’ de um sonho e não queria terminar de contar o ‘revelamento do Senhor’. Daí, até a cabeleireira pediu que ela recontasse o sonho, ao que ela começou me dirigindo a pergunta: “Você tem uma filha, não tem?” Hahaha. Eu respondi: “Não, eu tenho 20 anos e juízo, só isso” Desculpe, mas alfinetei porque de cara, sem precisar do espírito santo pra me revelar, percebi que aquela mulher tatuada tinha um passado a esconder. Um passado sem religião, no qual ela deve ter aprontado poucas e boas, a se perceber pelas impagáveis marcas no corpo. Um passado no qual a palavra pecado, se fazia algum sentido pra ela, era algo que trazia prazer, ainda que momentâneo… E é aí que se esconde toda essa minha revolta. Por que as pessoas ‘aceitam Jesus’ e começam a pensar só em pecados? Por que alguns cristãos tem a cara-de-pau de dizer que pecado é bom? Ora, porque eles gostam de ‘pecar’ e não seguem seus valores morais, eles nem tem isso. Eles gostam de seguir uma constituição imposta sem pensar. Eles não analisam e retém o que é bom. Os poucos que lêem a Bíblia a tomam como uma lei Geral, nos mínimos detalhes, sem ter trabalho de interpretar suas palavras. E o que nela não está escrito, mas que ficou implícito no ‘Tudo é lícito, mas nem tudo lhe convém’ é sempre ditado por um pastor. Pastor esse, que no caso da minha manicure, um conhecido meu, ganhou o seu diploma preenchendo um questionário de 100 perguntas bíblicas e pôde enfim, abrir o seu tão sonhado negócio lucrativo… Uma Assembléia, nada de Deus.
A cada bife que ela tirava do meu pé como uma provocação da minha resposta malcriada eu me lembrava dessa triste realidade. Da falta de estudo, da falta de capacidade de discutir, da preguiça intelectual de muitos evangélicos e o pior da má vontade de raciocinar… Lembrei disso porque uma amiga minha me disse há uns dias atrás que ora todos os dias a Deus para que Ele tire o seu raciocínio se isso for afastá-la de Deus. Logo o raciocínio, logo a única coisa que nos difere de um cão. E por falar em cão, às vezes ele pensa muito mais que essa gente… O ‘inimigo’ se instrui. A bibliografia dele é extensa, ele não se baseia só no livro da capa preta. Pior, ele não ouve apenas a opinião de um pastor – ser humano falho como qualquer um – e em muitos casos muito mal preparado.
Encerrando o caso, não poderia deixar de acrescentar que o DVD que a manicure ouvia era PIRATA, assim como todos os outros na estante. Mas isso o pastor dela não condena, afinal de contas, ele é quem empresta os DVD’s a ela…
Pense, por favor! Pense!
